Este blog foi criado para contar a história de bravura deste lindo anjo.
João Pedro nasceu com Hérnia Diafragmática Congênita (HDC) e permaneceu neste plano por apenas 28 horas. E neste pouco tempo que ele passou por aqui, deixou um linda lição de amor, força e garra.
Ele é com certeza um Anjo Guerreiro.


sexta-feira, 4 de março de 2011

03 de dezembro de 2010 - O pior dia da minha vida

Naquela sexta-feira, dia 03/12, acordei com o celular tocando. Era minha amiga e comadre Dani querendo saber como estava o meu pimpolho. Levantei, me organizei e logo chegou uma enfermeira pra trocar meu soro. Eu não via a hora dela trocar de uma vez pra eu poder ir logo pra Neo pra ficar com ele.

Assim que foi trocado, eu sai com o Amaral pra ir pra lá, só que no meio do caminho meu acesso começou a vazar e eu tive que voltar. O Amaral me acompanhou até o quarto mas assim que eu me sentei, já pedi que ele fosse lá na Neo ver o João Pedro.

Enquanto eu fiquei no quarto fazendo soro, algumas pessoas me ligaram pra saber notícias e logo o Amaral voltou. Ele disse que estavam fazendo exames no João Pedro e que não poderia ficar junto neste momento, então voltou pro quarto pra irmos nós dois juntos depois.

Era perto do meio dia e logo chegou ao nosso quarto a Psicóloga Mariane. Ela chegou nos explicando que estava ali porque era usual do hospital mandar uma psicóloga pra conversar com os pais de bebês que estão na Neo. Conversamos um pouco, ela queria saber como estávamos nos sentindo. Claro que eu queria que ele estivesse no quarto comigo, mas diante da situação, eu estava feliz por ter uma unidade especializada que poderia prestar todo o atendimento necessário.

Pouco depois, chegou ao nosso quarto a Dra Elizabeth, pediatra neo que estava tendendo ele, e ela nos disse com toda cautela “não trago boas notícias” quase tive um treco quando ela disse isso, mas não consegui reagir a nada e ela continuou “o João Pedro teve uma parada cardíaca e toda a equipe está em cima dele mas não sabemos se vamos conseguir reverter”. Ela ia falando e eu não queria acreditar, parecia que o chão estava saindo de baixo de mim. Então ela disse “se vocês têm fé, rezem. Eu preciso voltar pra lá”. Então ela saiu e a psicóloga disse que nos deixaria a sós pra ficarmos mais a vontade. Nesse momento eu e o Amaral começamos a chorar e rezar com toda nossa força. Eu não sabia nem a quem recorrer nas minhas orações, só pedia que Deus cuidasse dele e que não deixasse ele ir embora.

Ficamos uns 15 minutos ali rezando sozinhos quando entrou a Psicóloga e a Dra Elizabeth chorando nos dizendo “infelizmente não deu”. Meu Deus, ouvir aquilo foi a pior coisa da minha vida. Eu e o Amaral nos abraçamos e choramos desesperadamente. Eu lembro de ter gritado e ter perguntado aos céus “por que???? Se nossa história era tão bonita...” Não entendi porque aquilo estava acontecendo com a gente. A Dra Elizabeth me abraçou chorando e quando ela se afastou de mim percebi que ele tinha uma correntinha com dois pingentes que simbolizavam os filhos dela, e naquele momento eu pensei “eu não vou poder ter minha correntinha com um gurizinho”. Em poucos minutos passou um filme na minha cabeça. Tudo que eu sonhava fazer com o João Pedro veio a tona e em meio ao meu desespero, lembro de ter dito “eu nem pude segurar meu filho nos braços”. Então a Dra Elisabeth me disse que se eu quisesse ainda poderia fazer isso. Na hora eu rejeitei, não queria vê-lo. Pedi então que as médicas nos deixassem sozinhos.

Não tenho lembrança nítida do que fizemos enquanto estávamos sozinhos, só lembro de nos abraçarmos e choramos. Aí então lembramos que tínhamos que contar pras nossas famílias. Mas como fazer isso? Eu não tinha condições. Então larguei tudo isso pro Amaral. Fui um pouco egoísta, pois ele também sofria com tudo isso, mas eu não tinha a mínima condição de fazer nada.

O Amaral então ligou pro meu pai. Ele estava dirigindo na hora e ficou desesperado com a notícia. Não sei como ele fez pra voltar pra casa, mas foi ele quem falou pra minha mãe. O Amaral também ligou pra irmã dele e pediu que ela avisasse o resto da família. Em seguida minha amiga e comadre Fabi ligou pra saber como estava o JP, e quando eu falei o que tinha acontecido, ela não sabia o que fazer.

A Dra Elizabeth veio até o quarto pedir que fossemos até a UTI pra nos despedirmos dele, e eu aceitei. Me colocaram numa cadeira de rodas e foram me levando. Lembro de ver no corredor da maternidade que as enfermeiras me olhavam com tristeza nos olhos.

Assim que a porta da neo abriu, fomos entrando, e a medida que íamos avançando o corredor eu ia chorando mais ainda. Quando chegamos na salinha onde ele estava, foi horrível. Ele estava de fraldinha, sem nada daquelas mangueiras que tinham colocado nele quando nasceu, sem esparadrapos, estava ali, livre, deitadinho da incubadora. Nesse momento pude ver mais claramente como ele era lindo. Ele era perfeito. A cara do pai dele. Tinha a boca mais linda que eu já vi. Peguei ele no meu colo, trouxe ele no meu peito, abracei forte e embalei ele como se fosse fazer ele nanar. Olhei pra ele e falei o quanto eu o amava, o quanto tinha desejado que ele viesse pra mim, falei pra ele como ele era lindo, beijei ele e depois coloquei ele no colo do Amaral. O Amaral chorando também falou pra ele o quanto o amava, fez a observação de como o João Pedro era parecido com ele, deu um beijo nele e colocou ele de volta na incubadora. Nesse momento percebi que as médicas e as enfermeiras também estavam chorando.Chamaram uma pessoa da pastoral e juntos fizemos uma oração pelo João Pedro.Ter que virar as costas e sair da neo sabendo que eu não voltaria mais ali pra vê-lo foi horrível. Foi como se um pedaço do meu coração tivesse ficado naquela sala. Mas tivemos que deixar ele ali e voltar para o quarto.

No quarto, as enfermeiras me levaram um chazinho e me deram medicação pra acalmar. Comecei então a ter consciência do que estava acontecendo e comecei a pensar no precisava ser feito. Liguei pra minha mãe e pedi que ela fosse na minha casa buscar uma roupinha pra ele. Eu já tinha escolhido a roupinha que ele sairia do hospital, mas nunca imaginei ter que escolher a roupinha pra enterrar o meu filho. Uma coisa dessas nuca passa pela cabeça de ninguém. Minha mãe não sabia o que fazer, mas disse que faria isso pra mim.

Logo depois chegou ao nosso quarto o médico anestesista. Precisávamos acertar com ele o valor do procedimento, mas diante de toda essa situação, ele nem tocou no assunto, o Amaral é que saiu na frente pra resolver isso. O médico nos desejou força e recomendou que tivéssemos outro filho logo, pois da experiência que ele tinha, essa dor só iria amenizar com outro filho. Óbvio que naquele momento isso nem passava pela minha cabeça, mas ouvi atentamente a recomendação dele.

Assim que ele saiu chegou o obstetra. Conversou com a gente, disse que me receitaria um remédio pra secar o leite e se compadeceu muito da nossa dor. Enquanto ele ainda estava lá, chegou a minha amiga Vivi, dinda do JP, e ela ficou sabendo da notícia pelo médico, pois ouviu ele dizer que precisávamos passar bem por este luto. Lembro do abraço forte que ela me deu e do quanto ela chorou.
Depois disso, começou a chegar nossos familiares. Cada um que chegava era uma dor imensa. Todos esperavam tanto pelo João Pedro que lidar com essa perda não foi fácil pra ninguém. Eu lembro que pedi desculpas aos meus pais, por não ter conseguido fazer o neto que eles tanto sonhavam ficar aqui. De certa forma eu me sentia culpada por tudo o que estava acontecendo.  

Vi quando o Dr Lionel, que seria o cirurgião dele, entrou no quarto, mas bem na hora meus pais estavam chegando e ele deixou que minha família me abraçasse primeiro. Quando meu pai me abraçou me disse assim “não perde a tua fé minha filha, continua acreditando em Deus”. Depois disso o Dr Lionel me abraçou e só me disse assim “ouve o que teu pai te disse e em outro momento nós conversamos”. Então eu peguei as mãos dele e o olhei nos olhos e disse “o Sr era o anjo do João Pedro, pena que não deu tempo”. Ele nos abraçou e saiu com os olhos cheios de lágrimas.

Com nossa família no hospital, meu pai, meu sogro e o Amaral saíram pra começar a resolver as burocracias de registros, transferência de cidade, velório, sepultamento. O Amaral sempre foi atrapalhado pra fazer esse tipo de coisa, mas dessa vez ele que teve que assumir isso, pois eu na tinha condições.

Estávamos no quarto eu, minha mãe e minha irmã quando chegou a Débie, mãe da Cecília (que também nasceu com HDC e ainda estava no hospital). Ela entrou no quarto toda feliz e disse “soube que o meninão já chegou” e eu lembro de ter respondido “já chegou e já se foi”. Nossa, foi um banho de água fria nela. Nessas horas a gente não mede o que fala, e eu nem me dei conta de como respondi. A Débie ficou em choque. Me abraçou, sentou e conversamos. Foi bom, pois naquele tempinho com ela, consegui me desligar de todo aquele tormento.

Era quase 18 hs quando o Amaral encerrou a correria e então arrumamos as coisas para ir embora. Eu deveria ficar mais tempo no hospital, mas diante do acontecido, o obstetra que me atendeu nem hesitou em negar meu pedido de alta.

Quando eu estava saindo, uma das enfermeiras que me atendeu veio me abraçar e me desejar força. Ela estava chorando. Isso foi uma das coisas que me sensibilizou. Lá no Moinhos, todos, mas todos mesmo, se envolveram com a gente. Eu nunca tinha visto um profissional da saúde chorar por um paciente, e lá todos nos demonstraram muito carinho e atenção.

Chegando na porta de saída do hospital me deu baque. Ali eu me dei conta de que um dia antes eu tinha entrado lá com o João Pedro vivo, dentro da minha barriga e agora eu estava saindo sem ele nem na barriga nem nos meus braços. Chorei muito quando me vi naquela situação.

Quando entrei no carro, enviei uma mensagem pra alguns amigos avisando o que tinha acontecido e onde seria o velório. Foi a única coisa que eu consegui fazer, pq quando chegamos em Sapucaia, eu não consegui entrar em casa. O Amaral que entrou e pegou uma roupa pra mim, pois eu não tinha condições e entrar e ver as coisinhas dele, afinal, eu só queria voltar pra casa com ele. Coitado do Amaral. Ele teve que assumir um papel de dinamismo que não é característico dele. Hoje fico pensando o quanto eu abusei dele. Ele estava sofrendo tanto quanto eu, e ainda assim ele tinha mais eu pra carregar nas costas. Se não fosse ele e minha mãe, eu não teria suportado.

Troquei de roupa na casa da minha mãe e seguimos para a Capela. Quando chegamos, achei que eu não ia conseguir. Entrei e me deparei com um caixãozinho branco e com meu filho deitadinho lá dentro. Parecia coisa de novela, que a gente nunca acha que pode acontecer com a gente, mas infelizmente era verdade, era o meu filho que estava ali. Com uma roupinha bege que minha amiga Aline deu e na volta tinha uns brinquedinhos que minha mãe tinha trazido de casa. Eram os brinquedinhos dele, que eu tinha comprado, que ele tinha ganhado de amigos, tudo dele, que foi dado com o maior amor. Foi insuportável aquele momento. Pra todas as outras pessoas, inclusive nossos familiares, aquela era a primeira vez que estavam vendo ele, pois lá no hospital não era permitido entrar na neo se não fossem os pais.

Gente, hoje não consigo mais escrever. Vou parar, pois está muito difícil dar continuidade. Reviver todo esse sofrimento não é nada fácil muito menos agradável. Enquanto eu escrevia este post, tive que parar várias vezes, pois eu e o Amaral choramos muito. Mas resolvi continuar, arranjar força sei lá de onde, por ele, pelo João Pedro. Acredito que ele é quem me dá força pra seguir nesse objetivo. Quando eu conseguir, sigo o resto da história.

8 comentários:

  1. PAI E MÃE! TENHO ACOMPANHADO O BLOG DE VCS ATRAVES DA DEBIE! ME EMOCIONEI MUITO!
    SÓ TENHO A DESEJAR MUITA FORÇA, E TRANSMITIR AS MINHAS CONDOLÊNCIAS PELA PARTIDA DO JOAO PEDRO!
    GRAYCE, NÃO SE CULPE PELO QUE ACONTECEU, FIQUE COM SEU CORAÇAO EM PAZ!
    COM CERTEZA, O PEQUENO J.P ESTÁ OLHANDO POR VCS! COMO VC DISSE, ELE É UM ANJO!
    FIQUEM BEM, FIQUEM COM DEUS!
    BEIJOS, TATIANA

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  2. Grayce.... nossas histórias são tão parecidas, temos tantas coisas em comum... Sinto muitíssimo que o teu final não tenha sido como o meu... Sinto muitíssimo por ter que pensar no sofrimento que passou e ainda passa... Lembro das tuas palavras quando entrei pra vê-la, e quando me disseste, veio e já foi, eu queria que o chão se abrisse pra eu poder me esconder... Levei uns minutos pra assimilar e não sabia o que falar... Eu muitas vezes enquanto a Cecília estava na NEO pensei em como seria se ela nao suportasse... Mas meus pensamentos não iam muito longe, eu não conseguia nem mesmo pensar em como eu reagiria... E naquele momento eu estava diante de alguém q estava passando por akele momento que eu mais temia na vida e estava sem ação. Eu posso imaginar a dor, o desconforto, o sofrimento e o teu desespero... Só que diante de uma fatalidade dessas não há palavras que aliviem a dor de uma mãe... Ja te disse isso muitas vezes, Grayce tu é mto forte, muito guerreira!! Com certeza o JP de onde estiver se orgulha imensamente da mãe maravilhosa q ele tem...
    Mesmo de longe, saiba que te considero uma amigona e sempre que precisar poderá contar comigo.
    Beijos

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  3. Gryce
    Acompanhei mt a história de vcs através da Glau, ela conversava comigo sobre a felicidade da gravidez, a duvida da doença e a dor da perda. Ler o blog é reviver cada conversa que tive com ela.
    Por mais que eu tente, não consigo imaginar a dor que vcs sentiram e ainda sentem, mas tenho certeza de que Deus fez pelo melhor. A familia de vcs é muito linda e muito forte. Passar por tudo que vcs passaram e ainda continuar de pé é mais uma prova disso.
    Parabéns pela iniciativa de escrever o blog, os textos são ótimos e muito elucidativos.
    Adoro muito toda a familia de vcs!!!
    Grande beijo, Adri

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  4. Grayce, tive em 2007 minha primeira filhinha, descoberta a HDC logo após o parto. Resistiu 2h após o parto. Anota meu msn para trocarmos informações? taissp@hotmail.com
    Muita força e esperança de dias melhores! Abraço!

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  5. Oi Grayce,

    So tenho que desejar e pedir que Deus esteja sempre com vocês, e que ajude a superar esse momento tão dificil.

    bjs

    Fabi

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  6. Oi Grayce, sou amiga da Débie, mãe da Cecilia. Quero dizer que, acompanhei toda a angustia e sofrimento que Débie passou, e lendo os teus posts, pude viver os momentos de angustia q vc passou, é emocionate ler todos os teus relatos,e impossivel conter as lágrimas. Mas seu menino, agora é um anjinho. Foi um guerreiro. Te desejo forças pra superar tudo isso, pois seu menino não quer ver vcs tristes. Um forte abraço.

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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  8. Grayce, nem sei como encontrei o teu blog. Mas enfim, muito triste e ao mesmo tempo linda a tua história. Eu também tive o meu bebê no Moinhos, nasceu no dia 15.03.10 ficamos 65 dias na neo.Recebemos alta e ficamos só 04 dias em casa. E dia 25 de maio 2010, fomos para uma consulta no clinicas e nunca mais voltamos, ficou internado na uti, até o dia 08.11.10, dia que o meu tão amado filho partiu... É uma longa história... Ele estava com 07 meses. Sei o tamanho da tua dor e a falta que eles nos fazem. Hoje já 05 meses sem o meu Gabriel, a dor e a saudade parece aumentar a cada dia... Que Deus lhes de muita força. Vocês são pais abençoados e iluminados... Um forte abraço. Lizandra.

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